Canções e
Instrumentos Solistas
No dia 19 de Outubro de 2012, no Teatro Municipal
da Guarda, teve lugar o espectáculo Música
de João Pedro Delgado no âmbito do Festival de Música Contemporânea
Síntese. No concerto participaram por Gustavo Delgado (violino), João Pedro
Delgado (viola d´arco), Rogério Peixinho (violoncelo), Carlos Canhoto
(saxofones), Helena Neves (mezzo-soprano) e Nuno Santos Dias (piano). Coincidindo
com o dia da morte do poeta e jornalista da Guarda Manuel António Pina, o
concerto foi-lhe dedicado.
Programa:
·
“Duas Peças Negligentes” para viola e violoncelo
·
“Combray” para violino solo
·
“Forma Sonata” para saxofone e piano
·
“À l´ombre des jeunes filles en fleurs” para
violoncelo solo
·
“Guarda”, para saxofone e voz
·
Canções Mediterrânicas:
- “A açucena”, para voz e piano
- “Não fora haver tradição” para voz e piano
- “A formosura da invocação” para voz e piano
- “Longo será o teu sono” para voz, saxofone e piano
- “Fragmentos de Safo” para voz, saxofone e piano
João Pedro Delgado iniciou os seus estudos musicais no
Conservatório Regional de Viseu. Foi membro da Orquestra Sinfónica Juvenil
entre 1997 e 2002, na qual foi chefe de naipe das violas. Foi director
artístico da associação Belgais e do seu Coro. Foi colaborador musical e o mais
jovem autor de programas de sempre na Antena2. Colaborou, também, com
orquestras como Orquestra Gulbenkian, Orquestra do Norte ou Orquestra
Metropolitana de Lisboa, entre outras. Com o Quarteto de Cordas São Roque
apresentou-se já nas principais salas de espectáculo portuguesas, bem como no
México, China, Irlanda, Andorra, Inglaterra, Espanha ou Luxemburgo. Participou
em inúmeros festivais internacionais e vários concertos seus foram transmitidos
em rádios e televisões do país e estrangeiro. É membro do Síntese – Grupo de
Música Contemporânea. Lecciona no Conservatório de Música da Covilhã.
Sobre este
concerto o compositor adianta uma pequena introdução, que citamos:
Durante a segunda metade do Século
XX perdeu-se a ligação essencial entre a criação e interpretação musical. Na
busca de uma perfeição instrumental quase absurda, os intérpretes abandonaram
todas as preocupações criativas para se dedicarem exclusivamente ao
desenvolvimento da técnica pura. Simultaneamente, os compositores fomentavam a
necessidade de levar a complexidade da sua escrita a patamares ininteligíveis.
O compositor, encerrado noutra sala, assumiu a missão de inventar a roda a cada
nova obra, subordinando o conteúdo emocional e auditivo da música à estrutura, à
forma, ao algoritmo matemático, à gramática e a outros vectores, certamente
interessantíssimos para quem analisa a obra, mas pouco excitantes para quem
ouve…
Como disse Gasset, a arte
desumanizou-se e, digo eu, humildemente, ao desumanizar-se talvez tenha deixado
de ser arte…
O que procurei, ao construir as
obras a apresentar neste concerto, - muito modestamente, é certo -, foi um
regresso à música enquanto diálogo, à arte enquanto sublimação da humanidade, ao
momento artístico enquanto consequência natural da acção do Homem – já a
compor, já a tocar, como também a ouvir. Tentei assim recolocar a estrutura
enquanto instrumento ao serviço do conteúdo, a gramática subordinada à acção e à
emoção, a forma enquanto ergonomia musical ao serviço da “justa medida”.
Interpretação, composição,
audição, emoção: quatro conceitos que é necessário unir. Neste ponto, como
disse José Gomes Ferreira, “é urgente voltar ao romantismo”.
João Pedro Delgado
Reforçando o que foi dito pelo compositor, o
diálogo entre os instrumentos está invariavelmente presente em praticamente
todas as peças. Este diálogo – muitas vezes em forma de pergunta/resposta - é
realizado através de repetições/trocas de contextos melódicos entre os diversos
instrumentos, havendo pois uma fusão entre os instrumentos. Verificou-se a
exploração dos timbres e técnicas de cada instrumento com mudanças bruscas de
sonoridades (por exemplo, na peça para violino solo “Combray”), de andamento e
de dinâmica. Houve também um aproveitamento das possibilidades dos instrumentos
de cordas e do canto com a utilização do arco e pizzicato ao mesmo tempo ou a
leitura da frase pela mezzo-soprano “Às 8 horas da manhã do ano de 1932, o
termómetro da minha casa marca 1 grau abaixo de zero” na peça “Guarda”, por
exemplo. Por vezes, ocorrem repetições da mesma frase melódica que se encontra
desenvolvida, tanto nos solos como nos conjuntos. Isto é, nota-se que a ideia é
a mesma, porém há certas particularidades diferentes (notas, ritmo, etc).
Consideramos que a música contemporânea - aquela
que é composta na actualidade, não capta muito a atenção da população em geral,
sendo antes melhor recebida por pessoas detentoras de alguma formação musical.
Isto talvez porque a técnica se tenha sobreposto à musicalidade e à verdadeira
função da música que, julgamos, deve ser a expressão universal de sentimentos.
Relativamente ao concerto propriamente dito, a
utilização do diálogo instrumental relembra-nos conversas entre pessoas, as
dissonâncias transportam-nos muitas vezes para um hemisfério misterioso. Foram
criados ambientes diferentes dentro da música o que, de certa forma, tocou cada
uma de nós. Sim, porque música que é música vai sempre muito para além da “mera”
sonoridade ou do virtuosismo do seu executante: a música tem que ser emoção que
se vive e experimenta. A música, porque universal, tem que unir para além das
notas de que é composta, na mensagem que encerra e partilha.
Os músicos
utilizam de todas as liberdades que podem.
Beethoven
Lara Fernandes, Filipa Monteiro e Noémia
Souto
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